domingo, 27 de fevereiro de 2011

Tumulto no Médio Oriente, preparação para uma nova forma de encarar o Mundo

O que fará o Mundo Árabe e o resto do Mundo se ficarem sem água?
O uso de água no Norte de África e no Médio Oriente é insustentável e a sua escassez poderá dar lugar a mais instabilidade, para além da que já tem sido verificada, com os protestos na Tunísia, a revolta no Egipto, os tumultos na Líbia, e até mesmo o conflito Israelo-Palestiniano – que tem como uma das bases de sustento a luto pelo controlo de determinados aquíferos da zona de Gaza –, a não ser que os governos dessas nações tomem medidas para resolver essa outra crise em eminência de acontecer.
O Médio Oriente enfrentará conflitos ainda mais graves que os atuais, se o seu problema de escassez de água não for tido como crucial.
Pobreza, repressão, décadas de injustiça e uma enorme e galopante taxa de desemprego têm sido citados como os principais motivos das convulsões políticas no Médio Oriente e no Norte de África nas últimas semanas. Mas uma razão menos conhecida para os tumultos no Egipto, Tunísia, Argélia, Iémen, Jordânia, Líbia e até mesmo no Irão tem sido a escalada dos preços dos alimentos, diretamente ligados à crescente crise regional de água, pondo em causa a sobrevivência de populações inteiras.
Os diversos estados que compõem o Mundo Árabe, percorrendo a costa Atlântica de África até ao Iraque, têm algumas das maiores reservas petrolíferas do Mundo, mas isso disfarça o facto de que a maioria ocupa lugares hiper-áridos. Os rios são poucos, a procura de água tem aumentado ao ritmo do aumento da população, as reservas de água no subsolo estão a encolher e quase todas essas nações dependem de alimentos básicos importados que estão a ser negociados a preços record nos mercados internacionais.
Para uma região que espera que a sua população aumente para o dobro, para cerca de 600 milhões de habitantes, ao longo dos próximos 40 anos, e um agravar das altíssimas temperaturas, por via das alterações climáticas, estes problemas estruturais são uma dinamite política e já estão a destabilizar estas nações. Algo atestado pelas ONU, pelo Banco Mundial e por vários estudos independentes.
No futuro, o principal recurso geopolítico no Médio Oriente será a água, em vez do petróleo. A situação é alarmante!
O relatório Blue Peace  que analisa as perspectivas a longo prazo para 7 países, incluindo Turquia, Iraque, Jordânia, os territórios Palestinianos e Israel, conclui que 5 desses países já sofrem enormes graus de escassez estrutural de água, e a quantidade de água extraída de fontes já de si diminuídas, ao longo da região, não poderá continuar por muito mais tempo.
A não ser que exista um grande avanço tecnológico ou uma descoberta milagrosa, o Médio Oriente não escapará a uma séria escassez de água.
Os governantes autocráticos e senhores do petróleo têm sido capazes de controlar o seu povo, subsidiando fortemente das suas necessidades de água, de forma virtual através da compra de água em forma de gelo, importando de países como os EUA ou outros mais.
Mas as relações políticas entre países estão sujeitas a ruturas.
A água é uma parte fundamental do contrato social no Médio Oriente. Entre a comida e combustíveis subsidiados, os governos fornecem água barata, ou até mesmo grátis, para assegurar o consenso popular em torno da governação. Mas quando a concessão destes bens essenciais sofre cortes, geralmente seguem-se episódios de tumultos.
O próprio papel da água na recente inquietação geral tem sido limitado, mas é pouco provável que assim continue. A escassez de água no futuro será muito mais duradoura que no passado, e as técnicas que os governos têm utilizado para responder às perturbações do passado podem não ser suficientes.
O problema só poderá piorar. Os países Árabes dependem dos restantes de países de outras regiões mundiais para a sua segurança alimentar, é por isso que são tão sensíveis a cheias na Austrália e nevões no Canadá, que causam problemas no seu abastecimento de cereais. Como já aconteceu com o Egipto e com a Argélia, os maiores importadores mundiais de cereais…
Em 2008/9, as importações de cereais e outros alimentos, nos países Árabes, custavam 30 mil milhões de dólares. Na sequência, devido ao aumento dos preços das matérias-primas agrícolas, os milhões de desempregados e pobres nos países Árabes ficaram ainda mais expostos às dificuldades, dando origem a motins e combates por comida. O paradoxo das economias dos países Árabes é o seguinte, dependem da alta do preços do petróleo, manipulando os preços, ao mesmo tempo que os preços da energia geram aumentos de preços dos alimentos, tornando a comida cada vez mais cara. Grande paradoxo, não?
A zona mais insegura a nível alimentar e de disponibilidade de água é o Iémen, o país mais pobre do Mundo Árabe, que tem ao dispor menos de 200 metros cúbicos de água por pessoa por ano – bem abaixo do limiar internacional de pobreza, no que à água concerne, que são 1000 metros cúbicos por pessoa por ano – e ainda importa entre 80-90% da sua alimentação.
Segundo Mahmoud Shidiwah, presidente da agência para a proteção da água e do ambiente, 19 entre os 21 principais aquíferos do país não estão a ser repostos e que o governo tem considerado em mover a população de Sana’a, a capital do país, com cerca de 2 milhões de pessoas, que se espera que fique sem água, em estado de seca severa, num prazo de 6 anos. O responsável também admite que a escassez de água tem aumentado as tensões políticas entre grupos. Um grande problema…
Dois conflitos internos já desencadearam e estão em curso no Iémen e a capital tem sido tomada por motins populares. Existe uma ligação óbvia entre os elevados preços dos alimentos e as revoltas [na região]. As secas, as condições de vida da população e a escassez de água são os fatores agravantes. A pressão sobre os recursos naturais está a aumentar exponencialmente, e a pressão sobre os terrenos de cultivo é enorme.
Mas os outros países Árabes não estão muito melhor. A Jordânia prevê que a procura interna de água duplique nos próximos 30 anos, mas no entanto já enfrente uma massiva escassez deste recurso, por causa do crescimento populacional e devido à sua disputa de água de longa data com Israel. Os seus índices de abastecimento água per capita vão cair nos próximos 30 anos, doa atuais 200 metros cúbicos para 91 metros cúbicos, segundo dados do Banco Mundial. Curiosamente, a disputa entre Israel e Palestina também tem um grande foco na luta por recursos hídricos frágeis, por sinal…
Argélia e Tunísia, juntamente com os sete emirados nos Emirados Árabes Unidos, Marrocos, Iraque e Irão estão em "déficit hídrico" – usam mais água do que aquela que recebem através das chuvas ou de quedas de neve. Apenas a Turquia tem um excedente de água, mas não pretende partilhar. Abu Dhabi, o país que água esbanja em todo o Mundo, já admitiu que ficará sem as suas reservas de água num prazo de 40 anos. A Líbia gastou 20 mil milhões de dólares bombeando água de poços profundos no deserto, mas não tem ideia de quanto tempo vai durar o recurso. A demanda de água na Arábia Saudita aumentou 500% em 25 anos e deve dobrar novamente nos próximos 20 anos.
Os níveis de água no Mar Morto desceram em cerca de 150 pés, 45,72 metros, desde 1960. Os pântanos no Iraque sofreram uma redução de 90%.
Alguns países Árabes exportadores de petróleo já começaram a tentar resolver o problema de escassez de água. Tendo drenado aquíferos subterrâneos para o cultivo inadequado de terras, viraram-se para a aposta na dessalinização de água salgada. Acima de 1500 estações de dessalinização massiva encontram-se distribuídas entre a zona do Golfo e do Mediterrâneo, e fornecem a maior parte da água para consumo no Norte de África e no Médio Oriente – e dois terços do total de água dessalinizada do Mundo.
As estações de dessalinização absorvem água salgada ou salobra, e ao mesmo tempo aquecem-na, vaporizam-na e separar os sais das impurezas, ou passá-los através de filtros. Segundo a WWF – World Wide Fund for Nature, é uma energia cara, intensiva e emissora de gases de efeito de estufa, para obter água fresca. Mas os custos estão a cair e a indústria está a crescer, e acima de tudo pode-se combater a escassez de água, mesmo tendo em conta o nível de emissões de gases de feito de estufa associados ao processo, o que pode ser resolvido se instalar plataformas de painéis solaras acoplados a essas estações, de forma a alimentá-las com energia limpa, e colocar circuitos colectores de gases dos emissores dessas estações.
De facto é uma solução, mas o problema está ao nível da escassez, e prende-se com facto de a água ser um recurso finito no planeta; outro problema é o da segurança alimentar.

Alguns factos relevantes sobre a Água no Médio Oriente:
25% Aumento esperado da procura de água na zona Sul do Médio Oriente até 2020.
2,9% Crescimento da população do Iémen a cada ano.
14 Quilómetros cúbicos de perdas de água no Mar Morto nos últimos 30 anos (1980 – 2010).
240 Metros cúbicos de consumo anual de água por pessoa por ano em Israel.
75 Metros cúbicos de consumo anual de água por pessoa por ano na Cisjordânia.
0,53 Dólares custo por metro cúbico de água dessalinizada.
120 Estações de dessalinização nos Emiratos Árabes Unidos, Qatar, Bahrain, Arábia Saudita, Kuwait e Irão.

Como expliquei anteriormente, os elevados preços da energia, promovidos pelos países exportadores de petróleo para obterem maiores proventos, causam aumentos dos alimentos, situação que conjugada com escassez de água gera grandes confrontos entre cidadãos e governos.
Afinal o Mundo move-se a “pão” e água, e não a petróleo como muitos advogam.
Os resultados estão à vista nos recentes tumultos no Médio Oriente e Norte de África, em que o desrespeito pelos recursos ambientais naturais, a tirania e autocracia, a especulação petrolífera e a “necessidade” estão a moldar o Mundo. E nós temos que mudar, e mudar é começar por seguir três missivas fundamentais:
·         Tornarmo-nos independentes do petróleo vindo de países instáveis politicamente, e sem respeito pelos direitos humanos, autocratas e desregulados;
·         Gerir melhor o recurso ÁGUA, adotando comportamentos ambientalmente mais sustentáveis;
·         Promover medidas de racionalização alimentar e de balanceamento dos consumos.

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