segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

O Ambiente numa encruzilhada demográfica: Como sobreviver num mundo de nove mil milhões

Em 2050 a população mundial vai atingir novo marco. Seremos nove mil milhões à procura de alimentos, água, habitação e energia. Com conflitos, migrações e o efeito das alterações climáticas para gerir. Soluções, procuram-se.
Gente, gente, gente

O contador não pára. Em Portugal a população está a envelhecer, mas olha-se para lá do país e da Europa e a ideia deixa de ser um número: tudo indica que 2011 é o ano em que chegamos aos sete mil milhões de pessoas. Um artigo no diário britânico Guardian dizia que a comemoração seria a 31 de Outubro, com o nascimento de uma criança no estado de Uttar Pradesh, um dos mais populosos da Índia, com cerca de 194 milhões de habitantes.

A escalada continuará pelo menos até 2050, quando, segundo as previsões demográficas, formos nove mil milhões. As Nações Unidas estão a fazer um levantamento extenso das populações dos países para apurar melhor os números de hoje e corrigir previsões. Mas é esta rapidez que assusta.

Se os níveis de fertilidade e de mortalidade que temos hoje não se alterarem, a população mundial vai adicionar mil milhões de pessoas em tempos muito pequenos.

Herdámos este boom do século XX. Em cem anos a população passou dos 1,6 para os 6,1 mil milhões. O aumento não ocorreu porque as pessoas começaram a reproduzir-se mais; em vez disso (...) deixaram finalmente de morrer como moscas. Convém também alertar para as consequências económicas do envelhecimento das populações.

No século passado a saúde melhorou, a esperança média de vida passou de 30 para 65 anos e o progresso económico ascendeu no Ocidente. Em contrapartida, a fertilidade diminuiu muito na Europa e em países como o Japão - para níveis em que a população não está a ser reposta. O fenómeno atinge a China devido às políticas de natalidade.

Se a Ásia continua a ter os países com maior população (a China e a Índia estão em primeiro e segundo lugares com mais de mil milhões de pessoas cada), a fertilidade está agora na África subsariana. O continente, onde hoje vivem mil milhões de pessoas, vai duplicar o número até 2050.

Mas a Terra é capaz de ter tanta gente? A História da humanidade mostra que já fomos muito poucos, mas fomos sempre capazes de gerir as pessoas que tivemos. O número perfeito [de pessoas] tem que ver com o modelo da sociedade.

Depois de 2050, as previsões dizem que pode haver uma quebra na população mundial, ou pelo menos uma estagnação. Prevê-se que vá acontecer nos países emergentes o que aconteceu no mundo ocidental: um desenvolvimento económico acompanhado de uma diminuição de fertilidade. Até lá precisamos de espaço.

Cidades e migrações

Um relatório de Janeiro da Instituição dos Engenheiros Mecânicos intitulado População: Um Planeta, Demasiadas Pessoas?, que abordava as problemáticas deste assunto, alertava para a questão da urbanização. Metade da população mundial vive em cidades, em 2050 será 75 por cento. Se isso é evidente em metrópoles como São Paulo, Pequim ou Nova Iorque, não se pode esquecer África. Em 1950 só Alexandria e o Cairo tinham mais de um milhão de pessoas, no futuro 80 cidades do continente africano vão estar nesta situação.

A urbanização é uma resposta ao desenvolvimento económico. Os países mais urbanizados tendem a ser os que estão melhor, um exemplo importante é a China. O modelo de desenvolvimento económico que a humanidade inventou passa pela urbanização e não pela manutenção das pessoas no mundo rural.

Do ponto de vista ecológico traz vantagens. Tudo se torna mais eficiente, se as pessoas estiverem agrupadas - é mais fácil fornecer o saneamento, a água, a electricidade. Por outro lado, áreas com alta concentração de pessoas permitem deixar espaço livre. Algo que é fundamental para garantir que alguns ecossistemas sobrevivem e desempenham funções importantes.

Mas um dos maiores problemas destes grandes agrupamentos urbanos, em que as pessoas migram à procura de um estilo de vida melhor é que muitas vezes, e no caso concreto de África, as pessoas concentram-se em bairros de lata. As pessoas vivem miseravelmente, a mortalidade é alta, não há acesso a infra-estruturas, serviços, etc. Parte da solução é melhorar a habitação destes bairros, mas os governos muitas vezes não podem suportar essa despesa.

Há a questão da alimentação, um dos maiores problemas que se avizinham. As pessoas que estão nas cidades também comem, e muitas vezes comem mais produtos que são ecologicamente mais caros de cultivar.
África, o último campo agrícola

A proporção é conhecida, há comida para todos, mas um sétimo da população mundial está subnutrida, uma grande percentagem em África, e o outro sétimo come a mais. Em cima deste problema há o crescimento populacional e o desenvolvimento económico que muda os hábitos alimentares.

O Banco Mundial prevê que a necessidade de cereais aumente 50 por cento entre 2000 e 2050 e a necessidade de carne aumente 85 por cento durante este período. Para alimentar todos os animais do sector pecuário já em 2030, será preciso cultivar a mesma área agrícola que alimentava a população humana em 1970.

A resposta para os países ricos é sim, eles têm que consumir menos. As dietas são uma coisa fundamental que provavelmente tem que mudar, não só para salvar o planeta, mas porque sabemos que dietas muito ricas em comida animal são más para a saúde das pessoas.

Esta pressão já se fez sentir nas crises alimentares nos últimos anos, como a crise do arroz em 2008. No futuro, prevê-se um aumento no valor dos alimentos, que poderá tornar rentáveis espaços para a agricultura que até agora eram marginais, mas vai dificultar a vida às populações pobres, que gastam a maioria do seu rendimento em alimentação.

O espaço arável na maioria da Terra está preenchido. A revolução verde permitiu, através dos fertilizantes, pesticidas e das sementes, duplicar várias vezes o rendimento das colheitas, mas esse aumento tem limites.

África, contudo, ainda não teve a sua revolução verde. O desafio é que as mudanças nas técnicas de agricultura em África sejam suficientemente céleres e possam ter em conta a rapidez com que a população está a aumentar e talvez, se tivermos sorte, possam produzir comida para o resto do mundo. Convém também referir a importância da construção de infra-estruturas, acessos, locais de armazenamento dos produtos agrícolas para diminuir a perda de estrago, que ainda é enorme nos países africanos, e, por outro lado, a abrir a possibilidade de os agricultores competirem nos mercados nacionais e internacionais. Foram estas limitações que suscitaram crises alimentares como a da Etiópia em 2003.

Um desenvolvimento agrícola tem de ter em conta os recursos naturais. Não se pode importar modelos, nem se pode fazer o exagero que se fez nos países desenvolvidos. A agricultura tem que ser muito mais adaptada às condições naturais, muito mais sustentável.

Onde está a água?

Um dos maiores problemas actualmente é a degradação dos solos devido à má utilização, ao abuso excessivo de fertilizantes, que pode tornar uma terra estéril e poluir lençóis de água. Se não tiver solos, não tenho água; quanto mais contaminação de solos tiver no planeta, menos água potável vai existir.

As cidades podem ajudar a combater a falta de água. Quando a escassez ou as oscilações entre precipitação e períodos secos são cada vez mais demarcadas, o armazenamento de águas pluviais nas casas pode combater esta falta. Muita da água de chuva que cai não é aproveitada, por isso ainda é possível ser-se muito mais eficiente com o seu uso. É preciso armazenar esta água e aproveitá-la.
Novo paradigma energético

O bom aproveitamento dos recursos pode ser a diferença entre a morte e a sobrevivência. Há alimentos que se estragam, água que não é aproveitada e energia mal gasta. De todas as questões, a da energia é a que não está tão directamente relacionada com o aumento demográfico. Os países que estão a aumentar a população mais rapidamente não são os que estão a consumir mais. Se continuarem pobres e subdesenvolvidos, vão continuar a consumir pouca energia per capita. Não é o que se quer, mas é a realidade.

O problema é o mundo desenvolvido. Com ou sem aumento de população, o certo é que os combustíveis fósseis são finitos e estão a acelerar de dia para dia as alterações climáticas. É preciso mudar o paradigma da energia.

É preciso apostar na eficiência energética e na redução de consumo, de modo a que continue a haver energia para todos, suportando a mobilidade e a electricidade. Isto é importante que aconteça nos países desenvolvidos, de modo a diminuírem o consumo per capita. Por outro lado, é preciso disciplinar o aumento de consumo de energia dos países emergentes, de forma a não seguirem este caminho.

A nível tecnológico é ainda possível optimizar muito os recursos; depois é necessário passar gradualmente dos combustíveis fósseis para os combustíveis verdes. Para isso deverá melhorar-se a interconectividade entre regiões e países, de modo a fazer coincidir a produção de energia com o gasto. Muitos peritos sugerem a aposta na energia nuclear. Mas consegue-se perspectivar à escala mundial um fornecimento de energia sem nuclear, uma vez que isso acarreta vários problemas relacionados com os resíduos nucleares e o seu impacto na atmosfera. Mas não será possível acabar com o nuclear de um dia para o outro.
Gerir um clima imprevisível

Sobre todos estes factores cai um aspecto imprevisível: as alterações climáticas. Na agricultura, um futuro em que a variabilidade do clima é ainda maior vai obrigar os agricultores a estarem preparados. Isso não será possível sem ajuda. Os agricultores sempre tiveram que lidar com estas oscilações e no mundo desenvolvido eles fazem-no porque têm instituições que os ajudam. Estas instituições têm que ser expandidas para os locais onde não existem neste momento.

As cidades também vão estar sob pressão. Fenómenos como o ciclone Katrina, que em 2005 fustigou Nova Orleães, nos Estados Unidos, ou a precipitação que devastou a serra junto do Rio de Janeiro, no Brasil, no mês passado, não vão acabar.

Parte deste problema é que as pessoas são atraídas para as zonas litorais, onde existe um risco acrescido, mas que são mais interessantes do ponto de vista social. É preciso que as pessoas pensem sobre estes riscos e isso não é muito comum. A resolução do problema passa pelo ordenamento do território e por uma cartografia das zonas de risco.

Mesmo que as catástrofes não aumentem, com mais densidade populacional o mais certo é haver mais mortes. A forma como as pessoas e os governos funcionam é que esperam até as coisas estarem realmente más para se mexerem.
Já obtivemos todos os indicadores e avisos necessários para que não fiquemos parados. Cabe a cada um de nós fazer a sua quota-parte na luta por um futuro mais sustentável, nem que seja ao evitar deitar aquele “papelito” para o chão, passo o pleunasmo.

Sem comentários:

Enviar um comentário