sexta-feira, 1 de abril de 2011

Biocombustíveis: A corrida para a fome

Os espectadores que assistiram, no passado mês de Fevereiro, à prova Daytona 500, na Florida, receberam bandeiras verdes para celebrar a notícia de que os carros que participaram na corrida passaram a usar gasolina com 15% de etanol.
Foi o inicio de uma longa campanha de “Marketing” destinada a vender os méritos dos Biocombustíveis aos norte-americanos e ao mundo.
Um contributo para um futuro ainda mais cinzento em termos de crise alimentar, mas já lá vamos.
À superfície, a “autoproclamada” tendência verde da NASCAR (National Association for Stock Auto Racing) é tão-somente um exercício transparente e infortunado de uso do desporto como forma de branqueamento ambiental. Mas a parceria entre um passatempo adorado pelos norte-americanos e o lobby dos biocombustíveis marca a última tentativa para influenciar a opinião pública a favor de uma política verdadeiramente irresponsável e suicida.
Os EUA gastam todos anos cerca de seis mil milhões de dólares (4,23 mil milhões de euros) em apoios federais para ajudar a produção de etanol através de créditos fiscais, tarifas e outros programas. Graças a estes apoios financeiros, um sexto da oferta mundial de milho é queimada, literalmente, em carros norte-americanos. A nível mundial são 20% a 30% da oferta mundial de milho que são queimados nos carros. Só a quantidade de milho queimada nos carros norte-americanos é suficiente para alimentar 350 milhões de pessoas durante um ano inteiro.
Extremamente preocupante!
O apoio do governo ao rápido crescimento da produção de biocombustíveis tem provocado alguma confusão na produção de bens alimentares. De facto, em resultado da política oficial dos EUA e da Europa, na qual se inclui metas de produção agressivas, o biocombustível consumiu, em 2010, mais de 6,5% da produção global de sementes e 8% de todo o óleo vegetal. Em 2004, estas percentagens eram de 2% e praticamente zero, respectivamente.
 Neste momento, cada vez mais sou contra as metas da União Europeia no que toca à introdução de uma quota de 10% para o uso dos biocombustíveis, situação que agravará ainda mais as alterações climáticas, por via da desflorestação, diminuindo a captação de carbono, para promover plantações de milho e outros grãos, sem ser para consumo humano.
Este ano, após uma época de sementeiras particularmente má, os resultados estão à vista. Os preços dos bens alimentares a nível mundial são os mais altos desde que as Nações Unidas iniciaram registos, em 1990, impulsionados, em grande parte, pelo custo do milho. Apesar das recentes medidas para combater a má nutrição, os subsídios governamentais aos biocombustíveis vão levar a que milhões de pessoas tenham dificuldades em conseguir alimentos para sobreviver.
Já estivemos nesta situação. Em 2007 e 2008, o rápido aumento da produção de biocombustíveis provocou uma crise alimentar que incitou a instabilidade política e fomentou a má nutrição. Os países desenvolvidos não aprenderam. Desde 2008, a produção de etanol subiu 33%.
No inicio, os ativistas ambientais consideravam os biocombustíveis uma solução rápida contra o aquecimento global. Começaram a mudar de opinião à medida que diversas investigações concluíram que os biocombustíveis produzidos a partir de cereais alimentares não reduziam significativamente as emissões de gases de efeito de estufa – e, em muitos casos, provocaram a destruição de florestas para que fossem produzidos mais bens alimentares, criando mais emissões de dióxido de carbono do que os combustíveis fósseis.
Alguns ativistas ambientais apoiaram os biocombustíveis na esperança de que estes abrissem caminho ao etanol da próxima geração, feito sem recurso a plantas não alimentares. Isso não aconteceu.
Atualmente, é difícil encontrar um único ambientalista que continue a apoiar esta política. Mesmo o antigo vice-presidente dos EUA e prémio Nobel, Al Gore – que chegou a vangloriar-se de ter dado o apoio decisivo de apoio ao etanol – considerou esta política “um erro”. Al admite, agora, que apoiou esta política porque “tinha um certo apreço pelos produtores de milho do Estado de Iowa” – que, não por coincidência, eram cruciais para a sua campanha eleitoral de 2000.
É reconfortante saber que, perante as evidências, Al Gore mudou de opinião. Mas existe uma lição mais importante. Da esquerda à direita, existe um coro de vozes que contesta o apoio governamental aos biocombustíveis. Mas o problema, tal como Gore afirmou, é que “uma vez implementado um programa deste calibre, torna-se difícil lidar com os lobbies que o tentam manter em vigor”.
Nenhum governo pode parar um comportamento tão rentável. O que pode fazer é definir políticas que maximizem o bem-estar social. Infelizmente, quando se trata de políticas para travar o aquecimento global, proteger o Ambiente ou criar “empregos verdes”, temos tendência para tomar decisões apressadas que não passam o teste.
Os apoios governamentais aos biocombustíveis são apenas exemplos de uma política “verde” de reação imediata e automática que cria oportunidades lucrativas para um grupo de empresas que defende os seus próprios interesses mas que faz muito pouco para ajudar o planeta. Basta olhar para o apoio financeiro dados às empresas de energias renováveis de primeira geração. A Alemanha liderou o Mundo na colocação de painéis solares, financiados com 75 mil milhões de dólares (53,24 mil milhões de euros) de subsídios. O resultado? Uma tecnologia solar ineficiente e pouco competitiva instalada nos telhados de um país bastante nublado, que produz apenas 0,1% da oferta total de energia da Alemanha e que adiou os efeitos do aquecimento global em sete horas em 2100. Nada relevante, e tanto dinheiro esbanjado sem qualquer tipo de análise custo-benefício.
Tendo em conta as apostas financeiras, não é de estranhar que as empresas de energias alternativas e de biocombustíveis estejam a fazer tão forte lobby a favor de uma maior generosidade governamental. Pudera, se forem dispendidos milhares de milhões para investimentos ineficientes, é claro que muito têm a ganhar e abre algumas janelas de oportunidade para um futuro próximo.
Muitas empresas estão mesmo a jogar tudo no campo do “Marketing” para ludibriar a opinião pública, defendendo os supostos benefícios para o meio ambiente, segurança energética e alimentar e até para o emprego, e nenhuma delas resiste a um exame minucioso. Basta ver pelas declarações moldadas de Tom Buis, CEO da Associação Comercial de Etanol Growth Energy, que afirmou que “o negócio com a NASCAR levará o etanol norte-americano até à estratosfera”.
Para mal dos pecados de muitos que se opõe à produção de biocombustíveis, pelo menos um grupo já está rendido: os candidatos presidenciais norte-americanos. No mês passado, no Estado de Iowa, o possível candidato republicano, Newt Gingrich, ridicularizou “os ataques das grandes cidades” aos subsídios à produção de etanol. Já um representante da Administração Obama garantiu que apesar da maior subida dos preços dos alimentos que o mundo já assistiu, “não há razão para tirar o pé do acelerador” no que diz respeito aos biocombustíveis. Uma afirmação que deve ter soado como música nos ouvidos da indústria. Nada mais negligente…
De facto, existem milhões de razões para tirar o pé do acelerador. A humanidade agradece e o planeta suplica.

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